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Sertão da Farinha Podre

Por volta do século XVIII, a vasta região atualmente conhecida por Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba recebia o nome de “Sertão da Farinha Podre”. Nesse imenso sertão, situado entre as Capitanias de Goiás e Minas Gerais, havia um território, às margens dos rios Grande e Paranaíba, denominado Desemboque. As primeiras sociedades a habitarem a região foram os povos originários indígenas – Bororos, Parecis, Karajás, Araxás e Kaiapós. Mais tarde, a região do Desemboque serviu de acolhimento aos negros escravizados, que, refugiados da região das minas de ouro, organizaram-se em resistentes quilombos.

Por compreender terras férteis e que escondiam metais e pedras preciosas, o Sertão da Farinha Podre atraiu também as bandeiras, advindas de São Paulo, através da rodovia Anhanguera, por volta de 1700. No ano de 1766, instalou-se na região o Julgado de Nossa Senhora do Desterro do Desemboque, ponto de partida de várias expedições em busca de ouro e diamantes e, sobretudo, ponto estratégico de ligação e comércio com a região central do Brasil.

 

De uma humilde capela surgistes

À medida em que se aproximaram as últimas décadas do século XVIII, já se faziam sentir em todo o estado de Minas Gerais os sinais de decadência das lavras auríferas. A ruína da mineração na região do Desemboque trouxe o esvaziamento gradativo da povoação que se estabilizara no local, e, aos poucos, a alternativa da agricultura e da criação de gado foi sendo adotada, a exemplo dos demais núcleos mineradores da região central. Também, com o declínio da mineração, os exploradores organizaram expedições para a exploração de novas terras destinadas ao cultivo de lavoura e criação de animais; isso resultou no estabelecimento de novos arraiais nas primeiras décadas do século XIX.

Em uma dessas novas bandeiras, por volta de 1812, o vigário Cônego Hermógenes Cassimiro de Araújo Brunswick, junto do comandante regente dos Sertões da Farinha Podre, Major Antônio Eustáquio da Silva, deixou o Desemboque em direção ao Sertão do Novo Sul, à oeste, chegando às margens do Ribeirão das Abelhas do Borá. Na localidade, encontraram um grupo expressivo de garimpeiros que auxiliou Cônego Hermógenes a levantar um cruzeiro à esquerda do ribeirão para a celebração de uma missa, onde, posteriormente, instalaram um oratório dedicado ao Santíssimo Sacramento.

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Nos anos seguintes, conforme ata lavrada em 24 de agosto de 1820, Cônego Hermógenes mobilizou as autoridades e a comunidade ali instalada para a construção de uma capela no mesmo lugar em que fora fundado o oratório. O novo templo acelerou a implantação de novas casas e casebres até que, em 13 de setembro de 1870, criou-se oficialmente a Vila do Santíssimo Sacramento, por meio da Lei Provincial nº. 1637. Mais tarde, em 3 de junho de 1876, a localidade foi elevada a condição de cidade pela Lei n° 2216.

 

Desenvolvimento

Envolta em muita tradição e sob grande influência conservadora desde a sua criação, a história de Sacramento foi escrita por pessoas influentes e poderosas, mas também através do suor de trabalhadores rurais e urbanos.

O progresso econômico surge com a agricultura e a pecuária, impulsionados, na década de 1880, pelo desenvolvimento do transporte através da Companhia Mogiana de Estradas de Ferro e Navegação. Devido a localização estratégica do município, que faz divisa com o estado de São Paulo, a Companhia Mogiana chegou à região e instalou as estações ferroviárias de Jaguara e Sacramento-Cipó, pontos importantes para a exportação do principal produto agrícola, o café, e também para a importação e distribuição de mercadorias pela cidade e região.

Em decorrência da instalação da linha férrea da Mogiana na Estação do Cipó, em 1889, que ficava em uma área distante do centro da cidade; e da criação da Usina Cajuru, em 1913, que trocou a luz das lamparinas, lampiões e velas pela luz elétrica; Sacramento traz a empresa alemã Bromberg e Companhia para criar a linha dos Bondes Elétricos, a primeira do Brasil a realizar um percurso rural.  O Bonde percorria uma distância de 14km levando mais rapidamente as cargas e passageiros até a Estação Ferroviária do Cipó, às margens do Rio Grande.

Com o desenvolvimento do transporte e da produção e expansão do café, o incremento da imigração no interior do país foi intensificado e, entre 1870 e 1920, Minas Gerais recebeu um número elevado de imigrantes, principalmente italianos, que impulsionaram o progresso tanto na construção de casas comerciais de diversos ramos quanto no desenvolvimento das indústrias de arroz e café. Dentre essas famílias, a do Sr. Leonildo Cerchi fundou, em 1964, a empresa “Laticínios Scala” em Sacramento, hoje um dos laticínios mais bem premiados do Brasil.

O século XXI chegou e com ele novas indústrias surgiram como madeireiras e fábrica de bolsas e acessórios, como a Sak’s. Contudo, o setor da agropecuária ainda é o mais tradicional na economia do município e contribui com grande produção de grãos (soja, milho, café), cana de açúcar e significativo rebanho bovino para corte e leite.

 

Terra de cultura e fé

As religiões Católica e Espírita, principalmente, estão incorporadas no dia a dia dos sacramentados, representando os maiores eventos e com grande contribuição histórica para a cidade. A capela que deu origem a cidade, fundada em 1820, recebe desde o dia 04 de outubro de 2014 o título de Basílica, devido a sua padroeira, Nossa Senhora do Patrocínio do Santíssimo Sacramento, ser única. O local guarda, ainda, dois pontos que marcam a história da construção da cidade de Sacramento. Abaixo da torre direita, estão a capela de Nossa Senhora Aparecida e o memorial em homenagem ao filho de Sacramento Padre Vitor Coelho de Almeida, que se encontra em processo de beatificação junto ao Vaticano. E, no lado esquerdo, estão o Monumento da Padroeira e o Altar da Pátria, que abriga os restos mortais de Cônego Hermógenes, fundador da cidade.

Sacramento também é berço de um importante líder kardecista, Eurípedes Barsanulfo. Com ele, nasceu uma fé ardente que encanta e move religiosos de todos os cantos do país. O Colégio Alan Kardec, fundado por Eurípedes, foi o primeiro Colégio Espírita do Brasil e se encontra em perfeito estado de conservação, abrigando a casa de oração e o museu que guarda sua história.

A jornada de Eurípedes, entretanto, começou em uma área rural da cidade, a Fazenda Santa Maria, mais precisamente no Centro Fé e Amor, primeiro centro espírita rural do Brasil – fundado em 1900 por Sinhô Mariano, tio de Eurípedes e responsável pela sua conversão ao Espiritismo. Local de importantes manifestações espíritas no final do século XIX, Santa Maria ficou conhecida principalmente pelo trabalho fitoterápico iniciado por Sinhô Mariano, que funciona até hoje. Outro ponto turístico e patrimônio religioso do município é a Casa de Prece Chácara Triângulo, construída pelo trabalho da médium Heigorina Cunha, sobrinha de Eurípedes. A chácara recebe anualmente milhares de caravaneiros para assistir o tradicional culto das 9 horas da manhã de domingo.

 

“O teu nome é hino de amor”, diz o hino de Sacramento. Para além dos espaços físicos, é o povo sacramentano o maior patrimônio desta terra. Um povo alegre, afetivo, comunicativo, simples e devoto. As mais ricas manifestações culturais só existem por causa deles. Fanfarras, conjuntos musicais, grupos de teatro, folia de reis, congadas, moçambiques, capoeira, além dos tradicionais desfiles dos blocos e escolas de samba no Carnaval e da Cavalgada em comemoração ao Dia do Trabalhador abrilhantam o vasto legado dessa cidade tradicionalmente mineira.